sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Criando seu Fanzine - Segunda Parte




Olá, pessoal! Aqui estamos de volta para a segunda parte da nossa matéria. Na primeira coluna, eu mostrei um passo a passo bem básico pra a começar a projetar nossa história, e neste número eu vou detalhar melhor essa criação e, mais importante, como torná-la mais interessante para seus futuros leitores. E já que falamos dela, chegou à hora de analisar a sua futura história.


Para começar, o que você pretende contar com a sua história? O que te fez ficar empolgado, em primeiro lugar, para começar a criar? Um personagem heróico, cativante? Uma história criativa, diferente?  E até aonde a história que você quer criar é realmente sua?

Não levem a mal, não estou acusando ninguém de plágio. Até porque a sua história ainda nem existe, ela é pouco mais que uma idéia. E ela, invariavelmente, saiu de algum lugar.  Pode ser de qualquer lugar, um insight para uma história pode surgir nas horas mais incomuns, das fontes mais inesperadas. Olhar pessoas num ônibus pode ser o suficiente para ter uma boa idéia. E eu aposto que a sua primeira idéia nasceu vendo seu herói favorito em plena ação, seja numa revista, num desenho animado ou num filme. É normal, quase todo mundo faz isso. E mesmo quando não estamos criando uma história para valer, é normal "entrar" na sua aventura preferida, no lugar do herói/protagonista, pois você se identifica com ele.  


Uma história ou personagem cativante podem servir de inspiração para sua própria história.


Portanto, alguma coisa daquilo que vemos, ouvimos, lemos, gostamos, acaba surgindo naquilo que produzimos.  Como perguntei antes, a questão é o quanto desta história é realmente nossa, o quanto ela é original. Vamos supor que a sua história favorita é Cavaleiros do Zodíaco. E então você quer criar a sua própria história... e agora? Vamos ter um herói, portando uma armadura com origem mitológica? Só com este mesmo conceito, temos duas outras histórias, Shurato e Samurai Warriors. Temos outros exemplos, em geral histórias de sucesso acabam criando “formulas”, que as empresas seguem por serem lucrativas. Pokemon deu origem a uma série de histórias similares, como Medabot e Beyblade. Note que elas não são exatamente iguais, cada uma possui algo que a diferencia, ainda que a base seja bem parecida. Eu usei esses exemplos, mas tem muito mais, e em alguns essa similaridade é mais difícil de se perceber, por ser mais sutil. Mas, uma base mínima que seja sempre existe, mesmo nas que possuem um formato mais original.

Então, como todo mundo que já se propôs a fazer a sua própria história, com certeza você vai fazer a si mesmo a pergunta crucial: como posso fazer algo original, se já fizeram “tudo”? Bem, tenho uma boa e uma má notícia para você.

Primeiro, a má notícia: Não dá para fazer uma história 100% original.

É só pensar um pouquinho, já foram criadas tantas, mas TANTAS histórias, que parece impossível criar algo original. E faz sentido, se você pensar que só a civilização ocidental tem mais de 2000 anos, que temos registros de rudimentos de histórias (relatando caçadas, com uma linguagem pictográfica) desde o tempo das cavernas, e dá pra imaginar a quantidade de histórias que já foram criadas ao longo de tantas e tantas eras. E histórias novas são criadas todos os dias!

E agora, a boa notícia: Não dá para fazer uma história 100% original....hã???

Hehehe, calma, eu explico. Acontece que esse “100% original” é um valor abstrato, que não precisa ser realmente atingido. O “novo” é algo que pode até cativar por ser incomum, inesperado, mas também pode afastar, por não criar uma ligação com o leitor/espectador. Uma coisa hipotética que fosse tão original que não tivesse qualquer ligação com nada que já tenha sido criado, não seria aceita pelas pessoas em geral. Nós gostamos de uma certa familiaridade, de nos sentir “em casa”. Pense num filme antigo que você gosta bastante. De  vez em quando você se pega revendo ele, pela enésima vez, numa reprise na TV? É mais ou menos isso.

Então, o que temos que pensar quando estamos criando uma história, é em como atingir essa linha de equilíbrio entre o que é estabelecido e familiar e o que será a novidade, o seu diferencial. A boa noticia é que não é preciso reinventar a roda, você pode usar alguns conceitos básicos para começar. E a maneira mais simples de começar é analisar os “atores” que darão forma a sua história, os personagens. Afinal, no fundo, é a história da vida deles que você irá contar, não é? Sua história não é sobre guerreiros poderosos ou golpes fenomenais, a verdadeira história é a trajetória do seu(s) protagonista(s). O objetivo de vida deles pode ser alcançar o estrelato, vingar a morte de seu pai, conquistar um lugar ao sol, descobrir a verdade ao seu respeito... Existem muitos caminhos que você pode escolher, e é com base neles que a história vai atingir essa conexão com o leitor. Quanto mais profundo e interessante for o personagem, maior será a afinidade do leitor por ele, a ponto dele deixar de ser um risco num papel ou numa tela e assumir uma personalidade própria. Para auxiliar essa parte, o autor pode se valer dos chamados arquétipos, os modelos iniciais, contendo características básicas essenciais que formam o rascunho de uma determinada personalidade e que servem de ponto de partida para a elaboração de personagens. Essa etapa merece um estudo bastante apurado, e essa coluna ficaria gigantesca (ainda mais!!) se eu me aprofundar muito neste aspecto. Posso fazer uma futura matéria sobre isso, mas para auxiliar quem já quer desenvolver seus personagens, recomendo uma visita ao site dos nossos parceiros da Quadrinize (www.quadrinize.com), que tratam do assunto com uma abordagem muito detalhada e interessante.




Bom, isso atende ao aspecto da ligação com o leitor, o que seria a familiaridade....mas e a novidade? Em função do caminho que você deseja guiar seu personagem, é hora de analisar as escolhas que ele vai fazer. Voltando aquela nossa história de exemplo, supondo que a trajetória do personagem seja a vingança, ele quer vingar o seu pai, morto pelo líder dos bandidos da cidade. Note, essa questão da vingança é algo bastante familiar, muitas histórias se valem deste sentimento como motivação. O que vai diferenciar a história são os detalhes. É hora de se fazer algumas perguntas-chave: como seria essa vingança? Ele fará isso usando os punhos? Armas? Seria com armas de fogo, ou espadas? Essa história se passa no presente? No passado? Ou ele usaria uma armadura robótica, pois a história se passa no futuro? Nesta hora, não se prenda a uma convenção, não se limite, toda e qualquer ideia pode e deve ser ponderada. De repente, fazer um garoto lutando com os punhos para derrotar o vilão num confronto final pode ser algo muito...comum. Ou pode ser a coisa mais legal do mundo. Tudo é uma questão de se aprofundar nessas questões, e eu nem fiz muitas perguntas, dá pra ir MUITO mais longe. Mas, para isso, está faltando mais uma peça no nosso arsenal de criação: Bagagem.

Eu não sou um especialista na criação de roteiros, mas aqui vai uma dica que acho vital para qualquer um que deseje escrever histórias: leia bastante. Não falo apenas de quadrinhos, mas tudo, qualquer leitura, e também assista muitos filmes, seriados, desenhos animados. Não apenas como um leitor/espectador faria, mas analisando o material que você lê/assiste. Isso vai te trazer a “bagagem” necessária para quando chegar a sua vez de escrever. Como você sabe que “fazer um garoto lutando com os punhos para derrotar o vilão num confronto final” é algo “comum”? É por que você já viu isso em algum lugar, certo? Muda um ou outro detalhe, mas a base é parecida. Então, o conhecimento que você ganha vendo outras obras é que vai te dar o material necessário para criar essas ponderações sobre a sua futura história. Essencialmente, nosso exemplo ainda é uma história de vingança, como tantas outras. Mas, se você conhece muitas histórias do tipo, pode descobrir “buracos” que foram pouco explorados, por outros autores. Essa vingança tem que ser apenas física? Ela pode envolver outras questões? O personagem pode, por exemplo, destruir o império do crime do vilão, usando não apenas a força, mas a inteligência. Ele pode usar outros bandidos para isso, pode fazer o submundo da cidade se voltar contra o vilão principal. Isso em si não é novidade, mas conforme você se aprofunda na trama, as possibilidades aumentam. Como eu disse antes, não se prenda muito as convenções, pois sua história ainda é uma idéia, em formação. Até as reações do protagonista podem entrar em conflito com o que você pensou inicialmente a respeito dele. E, por que não se aprofundar nisso? E se o nosso herói se ver diante de um dilema moral, que para obter sua vingança, ele vai ter que fazer um sacrifício, agir de uma forma contrária aos seus princípios? Como ele reagiria? Ao invés de descartar esses conflitos, use-os para explorar ainda mais essas possibilidades, não só para tornar o personagem mais humanizado e verdadeiro, como ainda abre brechas para as inovações. E se o pai do garoto não fosse tão bonzinho, afinal? E se ele mesmo fosse o líder do submundo, no passado? O garoto vai seguir o legado do pai? E eu só estou falando do protagonista, mas isso se estende aos outros personagens, sejam aliados ou inimigos.  Em outras palavras, a novidade que você busca está nos detalhes, pois no geral, as histórias são bastante parecidas. Encontrar esse insight, esse detalhe que vai dar o diferencial a sua história, é um grande desafio, que exige uma carga muito grande de trabalho e de pesquisa.





Um detalhe importante, essa diferenciação pode ser sutil, não precisa ser nada do outro mundo. Algumas histórias nem sequer precisam de algo necessariamente novo. Um bom exemplo é o mangá Claymore. Trata-se de uma história muito bem executada, com um roteiro bastante instigante, mas nenhum dos elementos apresentados nela são realmente novos, quase tudo pode ser visto em outras histórias. Outro exemplo, que se diferencia num detalhe sutil é Full Metal Panic, que basicamente mistura gêneros comuns (militarismo, robôs gigantes, dia-a-dia no colégio), mas de um modo inusitado. Obviamente, tudo tem o seu “preço”: uma história muito comum precisa compensar a falta de diferenciação oferecendo algo que mantenha o leitor empolgado, com uma trama bem escrita e empolgante. E a questão da bagagem cultural volta a tona, pois é daí que vai sair a matéria prima para construir uma narrativa interessante.

Que trabalheira, não? E ainda estamos no começo. Mas, pelo menos já temos alguma idéia de por onde seguir. Por favor, não fique desanimado com a complexidade desta etapa, pois ela vai ser fundamental para criar uma história que mantenha o leitor interessado.

Por hora paramos por aqui, na próxima coluna, vamos colocar a mão na massa, e ver como levar as suas idéias para as páginas de uma revista.


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